01 DE ABRIL DE 2021

Perseguição agora é crime!

No último dia 31 de março de 2021, foi promulgada a Lei n. 14.132/2021, que acrescentou o art. 147-A ao Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para prever o crime de perseguição; e revoga o art. 65 do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais).

“Perseguição

Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

  • 1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido:

I – contra criança, adolescente ou idoso;

II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código;

III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma.

  • 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.

  • 3º Somente se procede mediante representação.”

Embora pessoas públicas sejam alvos mais frequentes de mensagens de ódio e assédios pela internet, casos como esses não são exclusividade dos famosos.

A evolução da tecnologia e o acesso à internet disseminado e na palma de nossas mãos são fatores preponderantes para o crescimento exponencial do número de usuários das redes sociais. Embora elas tenham surgido, com representatividade global, no início dos anos 2000 com o Orkut e o Myspace, seu alcance ainda era incipiente. O Orkut, por exemplo, chegou a ter “apenas” 66 milhões de usuários, nada comparado à rede social de Mark Zuckenberg. De acordo com o site statista.com, o Facebook supera tranquilamente a casa dos dois bilhões de membros, enquanto que o Whatsapp e o Instagram já bateram a marca de um bilhão.

Mas junto com a popularidade das redes vieram também alguns problemas. É crescente, por exemplo, a prática de ilícitos de diversas naturezas cometidos por meio delas e dos aplicativos digitais. É, também, cada vez maior o número de pessoas que sofrem com o chamado crime de Perseguição (cyberstalking – termo em inglês utilizado para descrever conduta de quem ilegalmente persegue ou assedia virtualmente alguém).

O comportamento perseguidor, de acordo com o Centro Nacional de Vítimas de Crime dos Estados Unidos, é caracterizado por “uma linha de conduta dirigida a alguém específico que leva pessoas razoáveis a sentir medo”. Os números dessa prática, seja virtual ou real, chamam a atenção: são 7.5 milhões de pessoas que sofrem algum tipo de perseguição persistente nos Estados Unidos; 11% são perseguidas por 5 anos ou mais; e 1 em cada 5 vítimas são perseguidas por um estranho.

Esses dados, aliados ao aumento de usuários de redes sociais, só tendem a crescer. Cada vez mais a população mundial expõe suas vidas na internet, permitindo que algumas pessoas se sintam “parte dela” e obtenham informações de diversas naturezas, tais como os locais que frequenta, com quem se relaciona, seus hábitos etc.

Essas informações são importantes para nutrir o assédio persistente do perseguidor (stalker), que pode ocorrer com o envio constante de mensagens, especialmente de ódio, por monitoramento incessante das redes sociais, propagação de notícias difamatórias, tentativa de contato com parentes, amigos ou pessoas do convívio do perseguido, podendo, inclusive, extrapolar o ambiente virtual, se desenvolvendo para perseguições nos locais em que sabidamente a vítima frequenta.

cyberstalking é definido como crime pelo ordenamento jurídico de diversos países. Na Alemanha, país referência em matéria penal, comete o delito quem “perseguir ilegalmente uma pessoa buscando sua proximidade” ou “tentando estabelecer contato” “por meio de telecomunicação ou outros meios de comunicação ou através de terceiros” (seção 238 do código penal alemão).

Agora, no Brasil, tivemos a reforma do Código Penal, que trouxe que “Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade”, é punida com prisão de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

A atual tipificação da perseguição virtual e do assédio persistente significa que tais condutas não mais ficarão impunes.

Por fim, a lei Maria da Penha (11.340/06) estabelece que a violência doméstica e familiar contra a mulher consiste em qualquer ação fundada no gênero que cause lesão psicológica. Como não há dúvidas de que o stalking pode ser uma forma de violência psíquica contra a mulher, ao agressor é também passível a aplicação das medidas protetivas de urgência previstas nessa lei.

Como se nota, o tema é bastante delicado, mas é importante que quem sofra uma situação de perseguição desta natureza não permaneça em silêncio e busque informações sobre como evitar que a conduta de seu agressor se perpetue e quais os mecanismos legais para enfrentar o problema. Por outro lado, é preciso distinguir a perseguição obsessiva virtual do acompanhamento, ainda que contundente, nas redes sociais.

Vale lembrar que as mídias sociais possuem ferramentas para que o usuário limite a sua exposição, com avançadas definições de privacidade, o que pode evitar situações indesejadas e comportamentos obsessivos de potenciais cyberstalkers.